Tributo ao padre João Edênio Reis Valle, que deixa um extraordinário legado

Tributo ao padre João Edênio Reis Valle, que deixa um extraordinário legado

Padre João Edênio Reis Valle. Foto Reprodução

Eu, frei Gilvander Luís Moreira, fiquei comovido hoje, 28 de outubro de 2023, ao saber da travessia do nosso querido irmão padre João Edênio Reis Valle para a vida em plenitude. Padre Edênio continuará sempre nos inspirando no caminho da libertação, porque nos deixou um extraordinário legado ético, teológico, pastoral e de compromisso com a construção do reino de Deus a partir do aqui e do agora, desde os/as injustiçados/as. Partilho com você uma retrospectiva da vida e atuação do padre Edênio, escrita pelo nosso irmão, um grande lutador em defesa dos direitos humanos fundamentais, Fernando Altemeyer. É o que segue.

Vida e atuação do padre João Edênio Reis Valle, que nos deixa um extraordinário legado. Por Fernando Altemeyer

Falecimento em 28 de outubro de 2023, aos 87 anos, de nosso amado padre João Edênio Reis Valle, S.V.D. Graduado em Filosofia pelo Seminário do Espírito Santo (1957), graduado em Teologia pelo Phylosophisch Theologische Hochschule Sankt Augustin (1961), graduado em Pedagogia pela Pontifícia Università Salesiana (1965) e especialização em Psicologia com doutorado em Pedagogia no Instituto de Psicologia da Pontifícia Università Salesiana de Roma-Itália (1974), com a tese: A secularização das atitudes sócio religiosas: sua conexão com algumas variáveis selecionadas da personalidade e do ambiente sociocultural Pesquisa positiva, sob orientação do Prof. Dr. Pio Scilligo. Presidente do Instituto terapêutico Acolher, Brasil. Foi professor associado de Psicologia da Religião no Programa Pós-graduado de Ciências da Religião, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Grande e qualificada experiência de ensino e pesquisa na área de Psicologia, Educação e religião, com destaque para os seguintes temas: psicologia da religião, psicoterapia de clérigos católicos, vida religiosa, família, espiritualidade, educação e escola católica e evangelização. Membro da Sociedade do Verbo Divino, conhecido como padres verbitas. Foi figura central no enfrentamento da violência contra a PUC-SP quando da invasão policial em 1977.

Relato comovente do professor Dr. Jorge Claudio quando da outorga do título de professor emérito em 28 de outubro de 2015: “Nascido em 8 de setembro de 1936, portanto está com 79 anos, estudou no tradicional Colégio Arnaldo de Belo Horizonte, da Sociedade do Verbo Divino. Nele cursaram Carlos Drummond de Andrade, Guimarães Rosa, Fernando Sabino, Milton Campos, Fernando Brant, Roberto Drummond, Betinho, Afonso Arinos, Ivo Pitangui e Patrus Ananias, ufa! Essa galeria faz jus à etimologia, pois o nome Arnaldo (do fundador da SVD, Santo Arnaldo Janssen) significa “ninho de águias”. Concluído o ensino médio, o jovem Edênio entrou para o seminário, onde estudou Filosofia e, a seguir, Teologia na Alemanha (entre outros, teve como professor o grande Karl Rahner!). Em 29 de outubro de 1961, foi ordenado sacerdote, aos 25 anos. A seguir, ingressou na Pontifícia Università Salesiana, de Roma, onde se graduou em Pedagogia, especializou-se em Psicologia e doutorou-se em Pedagogia/Psicologia. Esses cursos todos amadureceram nele o “sentimento do mundo”, ilustrado pelos versos em epígrafe. Exercendo liderança local e internacional, por vinte anos foi dirigente das conferências dos Religiosos do Brasil e Latino-americana. Lecionou Psicologia da Religião e Aconselhamento Psicológico em institutos de Teologia e Filosofia em São Paulo. Na saudosa Faculdades Anchieta, onde nos conhecemos, ensinou Filosofia e Psicologia da Educação. Desde 1969, trabalha nesta PUC-SP. É associado do Departamento de Ciência da Religião e foi seu chefe. Leciona Psicologia da Religião no Pós em Ciência da Religião, Programa que fundou e do qual foi coordenador.

O nome “Edênio” remete ao jardim das delícias; mas, ao contrário do zelador alado com cimitarra flamejante, abre suavemente as portas em direção à luz. Segundo as lendas, à semelhança do ser onipresente – a quem dedicou todo seu coração, alma e entendimento – se Edênio ainda não esteve em toda parte, algum dia estará… seu mundo não se restringiu à universidade, mas após longos desvios, sempre voltou para os braços de sua comunidade. Navegar é preciso. Sua atividade entre nós abrange (a) gestão comunitária e (b) produção acadêmica: a – Edênio fez rara dobradinha com a reitora Nadir Kfouri.

Sem exagero, tipo Pelé-Coutinho, entende? Como vice-reitor comunitário durante dois trepidantes mandatos (1976 a 1984), ele contribuiu para enraizar na PUC-SP a Teologia da Libertação e a resistência à ditadura, dando retaguarda ao inesquecível grão-chanceler Dom Paulo Evaristo Arns. Sua vice-reitoria se apoiou num tripé. A primeira perna foi o Instituto de Estudos Especiais, regido amorosamente pelo Professor José Queirós e equipe. O IEE realizou numerosos seminários, eventos e publicações, com o objetivo de aproximar a universidade das questões populares. O segundo eixo do tripé foi o TUCA. Sob a criativa direção da saudosa Professora Samira Chalhoub, o teatro da universidade foi palco de memoráveis eventos e 218 | Jorge Claudio N. Ribeiro Jr.; João Edênio Reis Valle; Maria Luiza Guedes; José J. Queiroz REVER ∙ Ano 15 ∙ Nº 01 ∙ Jan/Jun 2015 espetáculos de artistas críticos ao regime. O TUCA tornou-se um templo da resistência democrática e, não por acaso, foi incinerado em 22 de setembro de 1984. O terceiro eixo foi a Assessoria de Imprensa e Comunicação, conduzida por mim. Editamos o dinâmico jornal comunitário Porandubas, nome sugerido por Edênio durante almoço num restaurante fuleiro na rua Turiaçu. A coleção está na internet graças ao CEDIC. Nossa assessoria também produziu filmes sobre a invasão da universidade e o incêndio do TUCA, disponíveis no Youtube. Ao rés do chão, Edênio enfrentou situações intrincadas. Duas fotografias publicadas no Porandubas são paradigmáticas. A primeira mostra-o sereno na entrada do prédio sede, segurando prosaico abacaxi, em meio à tensa assembleia estudantil. Outra foto registra-o com Nadir, encarando, indignados, o troglodita que comandou a invasão da universidade, a quem ela não deu a mão: “Vocês não são bem-vindos. Aqui só se entra com nossa autorização ou pelo vestibular”. Após oito anos, chegava a hora de sua chama científica brilhar com mais fulgor. b – Números exuberantes atestam a produção do Professor Edênio. Orientou gerações de pós-graduandos, desenvolveu pesquisas sobre as relações entre Psicologia e experiência religiosa, integra o corpo editorial de sólidas publicações. Em mais de cem artigos e dezenas de livros, aborda os desafios do Catolicismo, a vida consagrada, a universidade e a educação da juventude. Trata ainda do abuso de menores, da sexualidade dos padres, e advoga o pedido de perdão pela pedofilia. Como tantos de nós, Edênio e eu temos uma história comum. Trouxe-me para a PUC-SP, celebrou meu casamento com Maria Inês, orientou-me no mestrado, sua bênção batismal tirou miraculosamente o recém-nascido Daniel da UTI e confortou Verinha antes da partida”.

Padre Edênio foi professor nas Faculdades Medianeiras, dos padres jesuítas de 1968 a 1970, assessor da C.N.B.B. (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), membro do I.S.E.R., membro ativo da comissão teológica da C.R.B. de 1975 a 1995, membro da Comissão Teológica da C.L.A.R. (de 1985 a 1989), professor no ITESP de 1978-1988, professor de pós-graduação no programa de Ciência da Religião na PUC de São Paulo desde 1969 com intervalos para os cargos exercidos na CRB e CLAR, até o seu emeritato em 2017.

Autor de várias outras obras, tais como: Viver e anunciar a Palavra, Psicologia e experiência religiosa, Que futuro para a vida religiosa no Brasil, Sexualidade: cultura, Ética e vida religiosa, Século XXI interpela a vida religiosa brasileira. Presidente da ANPTECRE (Associação Nacional de Programas Pós-Graduados em Teologia e Ciências da Religião) 2008-2009. 2. Ajuda financeira da CAPES-PAEP:ao do IIIo. Congresso Nacional da ANPTECRE (S. Paulo 2011), como Presidente da Comissão Organizadora 3. Ajuda financeira da FAPESP: a) para o 1o. Congresso nacional da ANPTECRE ( em 2008) b) Para vinda ao Brasil do professor-visitante Dr. Jacob van Belzen ( Novembro de 2011) 4. Apoio financeiro da Porticus Stifting da Holanda para Projetos de Pesquisa e bolsas de doutorado dos membros da Equipe de Pesquisa: Financiamento. Foi autor de 80 livros e capítulos de livros. Orientador de 19 dissertações de mestrado e de 23 teses de doutorado. A PUC-SP chora a perda de um intelectual de rara e exuberante beleza e finesse d´Esprit.

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