Celebração da Vigília de Natal (Lc 2,1-14) – Por Marcelo Barros

Celebração da Vigília de Natal (Lc 2,1-14) – Por Marcelo Barros¨

   “Não tenham medo! Eu lhes anuncio uma grande alegria que é a de todo o povo: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vocês o Salvador, que é o Cristo, Senhor” (Lucas 2,10-11).

É importante que, nessa noite, recebamos como boa notícia de salvação esse mesmo anúncio que, de acordo com o evangelho, proclamado hoje em todo o mundo, no meio de uma noite como essa, o anjo disse aos pastores de Belém. A cada ano, as Igrejas cristãs repetem esse Hoje que atualiza essa palavra para nós e para o mundo atual: “Hoje nasceu para nós o Salvador”.

Neste texto do evangelho, que repetimos em cada noite de Natal, o que podemos descobrir de novo é que o acontecimento divino ocorre apesar das intervenções opressivas dos poderosos do mundo, como, naquele tempo, para Maria e José, ressoou a ordem do imperador sobre o recenseamento. Daí vemos que, ao pretenderem se substituir ao projeto divino, essas intervenções do poder opressor não somente fracassam, mas até acabam por favorecê-lo. O tal recenseamento, ordenado por Júlio Cesar fez sofrer a José e Maria, porque os obrigou a viajar naquela situação de gravidez avançada, mas foi o que possibilitou que Jesus nascesse em Belém, como previam as escrituras. É misterioso isso: como um acontecimento opressor acaba favorecendo a realização do projeto divino.

Esse projeto ocorre no mundo e em meio aos eventos políticos, mas a partir do mais baixo e insignificante. Naquela noite, só quem testemunha o Natal de Jesus são pobres pastores, pessoas consideradas fora da lei, marginalizadas pela sociedade e pela religião vigente.

Esse evangelho mostra um grande contraste. De um lado, os pastores veem uma coisa linda e maravilhosa. Contemplam o céu se encher de luzes. Escutam o mensageiro de Deus anunciar o nascimento de Jesus e, a seguir, o cântico dos anjos que dá Glória a Deus e anuncia paz para a terra.

No entanto, era preciso que aquela palavra recebida dos anjos fosse confirmada por um sinal. Daí vem o grande contraste do Natal: O anjo diz aos pastores: vocês encontrarão um menino recém-nascido, embrulhado em palhas e deitado em uma manjedoura de animal.

Como é possível que todo aquele esplendor de luz e uma notícia decisiva e universal – a salvação para o mundo todo – tenha como sinal algo tão corriqueiro, humilde e quase banal, como é um menino pobre, recém-nascido, deitado em uma manjedoura? E como se traduz isso para nós?

Como ver o sinal de que Deus se revela em uma criança recém-nascida nos acampamentos de Sem-terra, nas aldeias indígenas ameaçadas de destruição pelo Marco temporal e pelo Capitalismo depredador e nas muitas Gazas de hoje em dia que o Império condena à destruição?

O evangelho desta noite nos chama para prestarmos atenção aos anjos que, hoje, no mundo, anunciam a boa nova da paz, como possibilidade de nova aliança da humanidade em favor da paz e da vida. E também somos chamados a reconhecer as manjedouras de hoje onde estão nascendo os sinais de uma humanidade nova.

Hoje, os anjos do novo Natal não vêm de um modelo de Igreja que se fecha em si mesma, de ministros e grupos religiosos, autocentrados, mais preocupados com cultos solenes do que em se inserir no mundo e serem pastores e pastoras pobres que pastoreiam a humanidade nas noites do mundo.

O anúncio da salvação que o Natal anuncia é dado pelas organizações da sociedade civil que reúne a humanidade em fóruns sociais, pelos movimentos populares que o papa Francisco chama de poetas da justiça. O anúncio da salvação de um novo Natal nos é dado pela luta pacífica dos povos originários em sua resistência e seu caminho de vida nova.

Vamos contemplar a manjedoura do novo Natal uns nos outros, na cotidianidade da vida e na luta que, passo a passo, travamos, para viver esse processo de humanização sempre maior e mais profunda. Assim, vamos engravidando o mundo de um novo Natal da humanidade que, apesar de tudo e contra tudo, vai se tornando divina. Feliz Natal para vocês.

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Nos anos 1980, na Argentina, Mercedes Sosa nos fazia ouvir a bela Canción de cuña navideña:

Todos tan alegres, llegó Navidad

y en mi rancho pobre, y en mi rancho pobre

tristeza sonó igual.

No llores mi niño, ya no llores más

que nadie se acuerda, que nadie se acuerda

que no tienes pan.

Allá en un pesebre, dicen que nació

un niñito rubio, rubio como el sol.

Dicen que es muy pobre,

pobre como tú, destino de pobre,

destino de pobre, destino de cruz.

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